No tema de hoje – Economia e Finanças –, especialistas apontam as questões mais prementes que gostariam de ouvir os políticos debater neste período eleitoral. Jorge Veiga França, presidente da ACIF, desafia mesmo os candidatos e coloca-lhes 10 questões centrais.
A Madeira está a atravessar um momento de crescimento económico, mas será que não há problemas na economia? A ter em conta os três especialistas que ouvimos sobre o tema ‘Economia e Finanças’, há – e muitos - e exigem uma resposta rápida. Desde a redução da carga fiscal, passando por respostas para responder à perda real do rendimento das famílias, até fazer face à pressão que vem do BCE sobre as taxas de juros que fizeram aumentar exponencialmente os empréstimos bancários.
Paulo Pereira - Redução fiscal bem esclarecida para não ser “usurpada pelo populismo”
Paulo Pereira, Presidente da Delegação Regional da Madeira da Ordem dos Economistas, considera que existe um conjunto de questões importantes associadas à redução fiscal que precisam de ser “devidamente esclarecidas”, senão, “corre-se o risco de uma sua usurpação pelo populismo”.
Numa análise ao tema da ‘Economia e Finanças’, no âmbito da proposta do JM para a discussão dos grandes temas nestas eleições legislativas regionais, a delegação da Ordem dos Economistas defende que os partidos políticos reflitam com cautela sobre a redução fiscal, para evitar futuros dissabores. Neste sentido, Paulo Pereira recorre a alguns exemplos em forma de alerta.
Diz o economista que a descida imediata do IVA para os níveis ‘dos Açores’ tiraria ao Orçamento Regional “cerca de 130 milhões de euros de receitas, cerca de 6,2% do total estimado para 2023 de 2,071 mil milhões e euros”.
A perda de receita que a redução para os valores dos Açores implicaria teria de ser compensada com um “corte imediato de igual montante” no lado da despesa. E logo surgem as questões: “Quais as despesas que seriam cortadas? Em quanto? Porquê estas?”, pergunta-se Paulo Pereira. Outra maneira de compensar a perda de receita seria contratando nova dívida de igual montante. Mas, neste caso, também há perguntas: “Quem empresta? Com que juros? A que prazo? Para pagar como?”. Uma terceira via seria “uma mistura das duas soluções anteriores”.
À questão da redução do IVA, o economista junta a “esperada reposição pré-PAEF dos níveis de IRS para todos os escalões”. Sendo o IVA e o IRS dois impostos fundamentais para a receita regional, a aplicar-se, em simultâneo, “as questões ganham reforçada dimensão”.
Isto porque Paulo Pereira analisa com prudência o argumento de que com a redução dos impostos, a economia vai crescer bem mais gerando mais receita fiscal do que aquela que será perdida pela redução dos impostos.
“Apesar de [ser uma regra] bem verdadeira, é contudo desconhecida na intensidade e no tempo”, adverte. Além disso, os efeitos não seriam “imediatos”, pois a economia, ainda que respeite “lógicas irrefutáveis de funcionamento”, “não é uma máquina com botões e manivelas que se enfia matéria-prima numa ponta e sai o produto acabado na outra em cinco minutos”.
Para o representante dos economistas madeirenses, “seria também interessante ser esclarecido por que motivo aqueles que louvam a descida do IRC para os níveis mínimos possíveis” não pensam o mesmo sobre o IVA.
O economista sabe que a descida do IRC (imposto sobre lucros das empresas) é sustentada pelos seus defensores na ideia de que resultaria em mais crescimento económico e em maior capacidade de novos investimentos, além de aumentar a produtividade trazendo efeitos sobre os salários. Já a descida do IVA é vista como uma medida que “não funcionaria”, pois as margens seriam absorvidas pelas empresas, que aumentariam os seus lucros. Mas Paulo Pereira não pensa da mesma maneira e pergunta: “O eventual lucro maior causado pelo IVA não presta para investir e o da baixa de IRC já é bom? É isso?”.
“É que se estas questões acerca de tão importante ferramenta não forem devidamente esclarecidas, corre-se o risco de uma sua usurpação pelo populismo, criando uma imerecida mas gradualmente crescente perda de credibilidade do tema da ‘redução da carga fiscal e seu impacto na economia e qualidade de vida das populações’ que terminará num pouco desejado estagnar da situação e abandono real da ideia”, refere.
O presidente da delegação da Madeira da Ordem dos Economistas acrescenta que as populações “merecem ser honestamente esclarecidas de forma a que possam suportar eleitoralmente políticas sustentáveis e deixarem de exigir o impossível senão, e citando o genial economista Thoams Sowell, só um mentiroso as pode satisfazer…”.
Jorge Veiga França - Presidente da ACIF-CCIM
O presidente da ACIF, Jorge Veiga França, coloca 10 perguntas aos candidatos dos partidos políticos que concorrem às eleições de 24 de setembro.
No âmbito do tema ‘Economia e Finanças’, Jorge Veiga França mostra um conjunto de preocupações e desafia os partidos políticos a se posicionarem antes de os madeirenses serem chamados às urnas.
“Que medidas deverão ser implementadas para resolver o problema da falta de recursos humanos nas empresas?”, pergunta o representante dos patrões na Madeira, que também se questiona sobre a política de imigração para suplantar falhas no mercado.
“Que papel deverá desempenhar a Escola Hoteleira na formação dos futuros quadros para o setor do turismo?”. E qual a função da Escola Hoteleira na implementação de “um programa concertado com o setor empresarial para captação e importação de recursos humanos, designadamente com alguns PALOP que acusam escassez crescente na Região e no País?”.
O presidente da ACIF quer também saber se os partidos políticos acham que o setor do turismo tem condições para continuar a crescer, ao mesmo tempo em que interroga sobre quais devem ser as medidas a tomar no sentido de garantir a sustentabilidade do destino.
Os constrangimentos relacionados com o Aeroporto da Madeira é outro assunto para o qual a ACIF pede respostas, nomeadamente como poderão ser resolvidos ou minorados os constrangimentos” da infraestrutura madeirense.
A imigração é uma preocupação para os patrões, mas a emigração também. Por isso, Veiga França quer que os partidos políticos digam quais devem ser as políticas a implementar pelo futuro Governo para garantir a retenção de profissionais qualificados na nossa Região, bem como o que fazer “para atrair, captar e manter profissionais de outras latitudes que não existam entre nós em número suficiente”.
Os impostos também fazem parte das preocupações da ACIF. “A Madeira tem condições para ter um sistema fiscal mais atrativo para as empresas?”, lança para discussão.
“Deverá ser criado um Fundo de Capitalização para as empresas, uma vez que as verbas previstas no âmbito do PRR para a iniciativa privada são insuficientes. Como deverá ser gerido este fundo?”, é outra dúvida.
A mobilidade aérea suscitou uma nova pergunta: “Como implementar um novo modelo de atribuição do subsídio social de mobilidade para os residentes e, simultaneamente, garantir a adesão das companhias aéreas que se encontram a operar na Região?”.
Jorge Veiga Franca quer ainda saber quais as alterações que deverão estar consubstanciadas na negociação do próximo regime do Centro Internacional de Negócios.
Por fim, o representante dos empresários pergunta que “estratégia deverá ser desenhada para potenciar a utilização dos novos cabos submarinos?”.
Elizabeth Ornelas - Contabilista certificada e sócia da Normifisco
É um “contrassenso” famílias e empresas estarem fragilizadas e a banca com lucros “estrondosos”
Elizabeth Ornelas, contabilista certificada e sócia da empresa Normifisco, vê as grandes questões da economia e das finanças em dois planos. Por um lado, na dimensão do cidadão consumidor e, por outro, na dos efeitos da conjuntura atual sobre as empresas.
No domínio das questões que afligem os consumidores, Elizabeth Ornelas mostra-se preocupada com o aumento das taxas de juro do Banco Central Europeu que está a ter efeitos sobre os empréstimos bancários, mas também com os valores das comissões que a banca está a cobrar “por tudo e mais alguma coisa”.
A pagar mais juros, sobra menos para outras despesas, reduzindo o poder de compra dos cidadãos – analisa. A isso soma-se a subida contínua da inflação, que encarece os bens essenciais e a conta do supermercado.
A empresária mostra-se preocupada também com o aumento do custo da eletricidade e com a perda de rendimento real dos cidadãos, já que o aumento dos custos está a ser em percentagem maior do que a subida dos salários.
No lado das empresas, Elizabeth Ornelas lamenta que a rendibilidade das organizações esteja “cada vez mais inferior” porque os custos de produção estão a subir, o que cria pressão e dificuldade para que as empresas possam acompanhar os aumentos salariais necessários para “garantir emprego com qualidade”.
A empresária chama a atenção ainda para a dificuldade para contratar pessoal com “qualificações intermédias”, defendendo, por isso, um aumento da formação profissional, de modo a gerar mais pessoas bem preparadas para trabalhos que não exijam profissionais altamente qualificados.
“Estes temas são preocupantes no nosso dia a dia. Nós lidamos com isto constantemente, com os empresários e com as famílias em geral. E acho que era importante haver um maior cuidado, no sentido de proteger as pessoas nestas temáticas que são sempre tão sensíveis”, disse Elizabeth Ornelas, fazendo notar que a maior fragilidade está, neste momento, “nas famílias mais carenciadas e nas empresas com menor rendibilidade”, enquanto a banca anuncia “lucros extraordinários, o que é um contrassenso”. E mesmo com lucros “estrondosos”, continua “com o aumento das taxas de juro nos financiamentos contraídos”, critica.
Ver Artigos
JM Artigo060923p4
JM Artigo060923p5