Luís Araújo será uma das personalidades convidadas para intervir na XIV Conferência Anual de Turismo (CAT), que se realiza no dia 12 de Novembro de 2021, no Funchal, organizado pela Delegação Regional da Madeira da Ordem dos Economistas. O presidente do Turismo de Portugal faz uma análise ao actual momento do sector, nomeadamente olhando para o momento da recuperação.
O tema deste ano da CAT é ‘Resiliência e Recuperação’. O que lhe apraz dizer sobre estes dois termos tão em voga no último ano?
O sector viveu momentos duros, muito duros, neste ultimo ano. A ausência de negócio, as restrições à mobilidade e os desafios de responder às necessidades do consumidor (financeiros, de comunicação mas sobretudo relacionados com a componente saúde) fizeram com que a resistência fosse posta à prova. Um sector que vivia momentos de enorme progresso (em Portugal crescemos as receitas em mais de 60% entre 2015 e 2019, reduzimos a taxa de sazonalidade para o valor mais baixo de sempre e conseguimos a maior diversificação de mercados) viu-se confrontado com paragem da actividade, quebras de receita significativas e uma enorme incerteza quanto ao futuro. É, por isso, mais do que justo que se fale de Resiliência no sentido de tirarmos lições dos desafios destes últimos anos, corrigindo algumas prioridades, e de Recuperação como a retoma da actividade ainda que em moldes diversos do que vivemos em momentos pré-crise.
O turismo, certamente, tem sido um dos sectores mais afectados, mas tem mostrado uma capacidade de resistência que o surpreende ou nem por isso?
O turismo sempre foi um sector forte em Portugal. Somos o 12.º país mais competitivo do Mundo e o 1º a nivel de qualidade das infraestruturas turísticas (dados do World Economic Forum). Os nossos activos continuam intactos e a marca Portugal está muito bem posicionada. O Estudo que temos de 2019 (Brand Asset Valuator – feito pela Y&R, Universidade de Dortmund e MIT) mostra-nos uma marca Portugal fortemente relacional, autêntica, charmosa, inovadora. Uma marca alavancada nos factores de sucesso do Turismo, sobretudo nos soft skills das pessoas, o que demonstra o poder que o Turismo teve e tem de promover outros sectores de actividade económica e influenciar a decisão de compra de muitos outros produtos nacionais. Dito isto, não me surpreende esta capacidade de resistência pelo histórico de crescimento e pelo conhecimento que hoje temos do produto, dos mercados e dos diversos segmentos em que trabalhamos.
A ‘Recuperação’, que será o tema do painel em que irá participar, foi melhor conseguida em Portugal ou é algo que está a ser transversal entre os mercados concorrentes ao nosso país?
A Recuperação tem sido mais conseguida nos destinos em que existe menos limitações à mobilidade, em que as regras são claras e transparentes e em que existe capacidade produtiva de resposta à procura e suas necessidades. Temos visto que, a nível europeu, quanto menos limitações existem na acessibilidade ao país, mais rápida é a retoma. Os dados que tínhamos e temos são de grande procura pelo destino em diversos pontos do globo e isso reflecte-se nos níveis de procura para Portugal logo após uma abertura ou sinalização verde. Acredito que muito se deve a esta ‘manutenção’ dos principais activos (sobretudo o humano), tendo para isso contribuído, certamente, os 2,6 mil milhões de euros de apoio às empresas em Portugal, cerca de 1/3 a fundo perdido, essenciais para poder dar resposta imediata à procura reprimida pelas limitações impostas. Mas foi igualmente importante mantermos esta comunicação clara e transparente com o trade (mais de 500.000 pessoas de diversos mercados participaram de webinares em conjunto com as delegações do Turismo de Portugal espalhadas pelo Mundo), mostrando que estamos preparados para receber qualquer pessoa dando-lhe uma experiência ainda mais dirigida às suas necessidades (daí a importância do sucesso do Clean and Safe com mais de 22.000 selos atribuídos e as 160.000 pessoas que fizeram formação online nas escolas do Turismo de Portugal e na sua nova Academia Digital).
Todavia, apesar de sabermos que muitas das medidas foram tomadas com o foco no controlo da pandemia, é necessário retirar as lições destes meses de limitações à mobilidade (das quarentenas aos mapas coloridos) e reforçar aquilo que o ECDC (European Center for Disease Control) disse: que o turista, a partir do momento em que existe transmissão comunitária, é o grupo de risco que menos contribui para a propagação do vírus.
O turismo na Madeira, por motivos óbvios, sofreu ainda mais com esta pandemia. Há margem para se sair desta crise com a cabeça levantada?
Estamos já a sair. A conectividade é essencial e, se os indicadores do Verão são positivos (60% da conectividade de 2019 em todos os aeroportos), o Inverno demonstra boas perspectivas com recuperação entre os 80 e os 90% da capacidade de 2019. Isto, obviamente, dependente sempre da evolução positiva do controle e da capacidade de mantermos os load factors altos. De qualquer forma a nossa estimativa para Portugal é a de crescimento em 2021 e 2022, retomando os valores de 2019 já em 2023. O objetivo final será alcançar os 27 mil milhões de euros da receita turística em 2027. Acredito que a imagem da Madeira saiu reforçada durante este período e existe capital de confiança que importa capitalizar. O facto de termos sido descobertos por novos segmentos (clientes mais jovens, directos, famílias, estadias mais longas) permite-nos olhar para o futuro com optimismo, mas também com enorme responsabilidade pois é importante responder às diferentes exigências (desde o produto ao serviço passando pela experiência do destino como um todo) deste tipo de clientes.
Sendo certo que a pandemia continuará, aparentemente nos próximos meses, a marcar as nossas vidas, com que expectativa encara 2022?
2022 será um ano de muita concorrência. Se considerarmos que as condições de acesso serão dirimidas para todos, que a mobilidade entre países e continentes retomará a normalidade e que a confiança nas viagens e nos destinos voltará ao momento pré-pandemia, esta questão será essencial. Igualmente teremos os destinos e os produtos a competirem pelos melhores clientes, pelo que é essencial que exista coordenação (publico e privado), recursos bem aplicados e foco naquilo que queremos para o nosso país. Em resumo, voltar a insistir no nosso propósito de receber e respeitar as diferenças.
Considerando o trabalho destes últimos anos e de estarmos estruturalmente fortes para o futuro, encaro os próximos meses e ano com muito optimismo.
O trabalho de promoção do turismo nacional no exterior também exige outra abordagem e, quiçá, novas perspectivas. Quais devem ser, para si, os focos em que a Madeira deve se centrar para atrair mais e novos mercados emissores?
Acredito que tudo passa pela capacidade de inovação que consigamos imprimir ao destino: desde o produto ao serviço, passando pela experiência de qualidade. Sobretudo superar as expectativas de quem nos visita. A promoção é essencial e sabemos o que precisamos, desde a conectividade (importante o reforço e diversificação das ligações) até os mercados de aposta e os segmentos alvo. Num Mundo em que as mensagens se perdem pela multiplicidade de meios e fontes, é essencial que exista ainda mais coordenação (nacional, regional, local, publica e privada). Temos trabalhado em conjunto (Turismo de Portugal, Secretaria Regional, Agência de Promoção, privados) pelo que acredito estamos no bom caminho.
Mas a promoção é só uma parte da equação. Temos que actualizar a nossa oferta (do produto ao serviço), responder às necessidades e diferentes gostos de quem nos procura, surpreender os que já nos conhecem e encantar aqueles que nunca nos visitaram. Apostar na atractividade do sector para quem nele trabalha, captar e reter os melhores, Qualificar os nossos recursos numa óptica de crescimento, não apenas de cumprir serviço, focado nas necessidades de cada colaborador e consciente que a demografia não perdoa e que cada vez seremos menos para servir mais. Finalmente o digital e a tecnologia como meio para comunicar melhor e chegar mais longe, saber mais e aumentar a eficiência das nossas operações. Isto aplica-se à Madeira mas também a todo o país.
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