Com o anúncio de medidas mais concretas de apoio à economia e às empresas, que será realizada hoje pelo Presidente do Governo Regional da Madeira (ver destaque), o DIÁRIO ouviu o presidente da Ordem dos Economistas na Madeira, Paulo Pereira, sobre o que importa fazer neste momento, entre outras questões sobre esta crise sem precedentes nos nossos tempos. O gestor aponta dois pontos importantes: há que acautelar a sobrevivência das micro, pequenas e médias empresas (PME), que representam 99,9% do tecido empresarial madeirense e 80% do volume de negócios (dados de 2018), mas também assegurar que o turismo seja o “motor de arranque” da recuperação pós-Covid-19.
Chegamos a um momento de quase total paralisação da economia madeirense. É um facto. Agora, frisa Paulo Pereira, “há que sobreviver”. E acrescenta: “A grande preocupação económica tem de passar obrigatoriamente por aguentar o sector privado regional, as empresas. E não me refiro às grandes, às ‘campeãs’ regionais que empregam muita gente, pois essas têm dimensão e estão em sectores que atrairão sempre investidores de qualquer lado. Refiro-me às micro, pequenas e médias empresas. As que sustentam diariamente toda a nossa vida económica e paz social. E essas são frágeis, e não é por culpa própria na grande maioria dos casos. E se as deixarmos fechar, dificilmente reabrirão ou outras no seu lugar, pois há uma falta de capital gritante na nossa pequena economia. E empreendedores válidos também. Não podemos perder os que temos.”
Esta advertência segue a outra, conectadas que estão, também, as do sector do turismo, ainda que praticamente todos os sectores estejam a sofrer. “Praticamente tudo na Madeira vem de fora, desde o primeiro madeirense ao Covid-19”, lembra e coloca em perspectiva. Por isso, “quando esta situação normalizar, o ideal era o turismo recuperar em força como motor de arranque da restante economia regional onde tem um peso directo e indirecto relevante, para mais trazendo dinheiro de fora que não vem de mais endividamento (público ou privado). Agora não sabemos como reagirão os consumidores ao pós-Covid, quer em termos de apetência pelo destino, quer pela sua própria situação económica, pois esta crise vai deixar mazelas nos consumidores dos mercados emissores”, aponta. “Depois teremos ainda a recuperação das companhias aéreas e a atenção/aposta que quererão fazer neste destino, que não dominamos. Da parte da Madeira, o importante é estar preparado para a retoma (não deixando cair as empresas e a paz social) e numa forte promoção”, aconselha.
Questionado sobre o facto de vários negócios terem tido vendas nunca vistas, nomeadamente o retalho, as farmácias, quiçá outros, não sendo possível justificar ou quantificar este ‘boom’ que agora se seguirá um tempo de menores vendas, Paulo Pereira lembra que “é normal que quem pode (quer em recursos financeiros, tempo e capacidade física) tenha optado por comprar mais coisas que as necessárias, uns por pânico, outros por racionalidade sabendo que depois iam haver filas e faltas de coisas por causa do pânico. É uma profecia autoconcretizadora: por temer que aconteça, faço coisas que fazem com o que temia aconteça. Agora essas vendas daqui a uns meses não existirão, pois as pessoas estarão em casa com excesso de stock”, justifica.
Implementar é mais urgente que anunciar
Já quanto a medidas de apoio á economia e famílias, o responsável da OEM, critica o Governo da República que “anda a baralhar os agentes (empresas e trabalhadores) com anúncios constantes e que se atropelam constantemente, fazendo as pessoas hesitarem em dar passos concretos”. Ou seja, “na prática até usaram esta semana para sacar mais dinheiro às empresas ao adiar até o ultimo dia a suspensão do pagamento da segurança social, o que fez com que a grande maioria das empresas, a custo e com risco de não poderem pagar salários já este mês, já o tivesse pago com medo de alguma sobrecarga no sistema e que depois não pudesse ser elegível para linhas de credito e para os fundamentais ‘layoffs’”.
E continua as críticas: “Convém as pessoas saberem que não há ainda um único euro nas empresas das linhas que têm vindo a ser anunciadas. O que houve foi o contrário, este mês as empresas tiveram de pagar IVA, Segurança social, retenções e outros impostos. É incrível como os privados já foram obrigados a contribuir, com perdas de liberdades e direitos (veja-se os senhorios), enquanto o Estado para ele está a sacar enquanto pode e a cobrar juros. E os bancos estão a adiar o anúncio de carências a famílias e a empresas, a esperar certamente algum conforto jurídico do Governo que substitua a necessidade de milhões de pessoas irem às agências assinar adendas”.
Já o Governo Regional, “dentro das suas limitações legais e orçamentais”, reconhece, “parece estar prestes a anunciar um pacote de medidas que espero que ajudem mesmo as empresas, e com elas as famílias. As anunciadas pelos Açores hoje (ontem), à primeira vista, vão no sentido certo, mas implementar é mais urgente que anunciar”, ajuíza.
Sobre os impactos desta crise anunciadas pelo Governo em cerca de mil milhões de euros, Paulo Pereira analisa: “Compramos um seguro de vida sem sabermos o preço do prémio a pagar. Nunca se consegue prever números e datas em Economia. Isso só esta ao alcance de astrólogos, alquimistas e políticos. O que está bom de ver é que será uma quebra significativa na actividade económica. Se será uma contracção de 10, 15 ou mais de 20% só o tempo o dirá. O choque imediato é gigante. Depois, e dependendo do que deixarem do tecido empresarial sobreviver e da tal recuperação internacional, podem ser números que sejam atenuados até o fim do ano.”
Última palavra ao desemprego. “Crescerá certamente. Não se sabe a dimensão, mas crescerá. Muito dele será evitado se as acções forem tomadas agora o quanto antes, para repor músculo nas empresas e confiança nestas e nas famílias face ao futuro próximo”, conclui.
MEDIDAS EXTRA HOJE
O Presidente do Governo Regional anuncia hoje, 22 de Março, pelas 19 horas e por vídeo-conferência, o primeiro conjunto de medidas extraordinárias de apoio às empresas e às famílias madeirenses e portosantenses, no âmbito do plano de contingência e resposta ao surto do Covid-19 na Região autónomo. O líder do Governo Regional reuniu-se na quarta-feira com membros do seu Executivo, com vista à preparação de um conjunto de medidas nas áreas económicas e sociais, de apoio às empresas e às famílias madeirenses e porto-santenses, de modo a complementar as propostas que vêm sendo anunciadas no âmbito do plano de mitigação do Covid-19. Na altura, foi feito um primeiro balanço sobre as medidas já introduzidas, colocando o foco no que será necessário fazer para alavancar a economia e garantir direitos sociais, de modo a diminuir o impacto do coronavírus, e da crise por ele suscitada, na economia madeirense e em toda a população. Segundo nota da Presidência enviada à redacção, trata-se de medidas que “vão ao encontro de algumas das propostas também sugeridas por empresários das diversas áreas, mas igualmente por diversos sectores da Sociedade, na sequência de contactos estabelecidos pelos membros do Governo Regional com a banca, com a ACIF e com outras entidades”. S. A. S.